Como minha organização pode apoiar a amamentação no local de trabalho?

A amamentação é um ato fundamental para a saúde e o bem-estar tanto do bebê quanto da pessoa que amamenta. No entanto, para as lactantes que retornam ao trabalho após a licença-maternidade, conciliar o cuidado com o bebê e as responsabilidades profissionais quase sempre é desafiador.

Neste artigo, discutiremos maneiras pelas quais as organizações podem apoiar a amamentação no local de trabalho, considerando políticas, legislação e práticas que promovam um ambiente inclusivo e acolhedor para pessoas lactantes. 

Benefícios da Amamentação no Local de Trabalho

Antes de abordar as estratégias para apoiar a amamentação no local de trabalho, é importante entender os benefícios para as pessoas que amamentam e para as organizações. O leite materno é o alimento exclusivo recomendado para bebês até os seis meses de idade, sendo a principal fonte de nutrição no primeiro ano de vida e uma parte importante da dieta até pelo menos os dois anos de idade, de acordo com as recomendações da Organização Mundial da Saúde (OMS). 

A amamentação oferece uma série de benefícios para o estabelecimento de vínculos, apego seguro e saúde, tanto para o bebê quanto para a pessoa que amamenta:

Estabelecimento de Vínculos e Apego Seguro

  • A amamentação cria uma oportunidade única para o estabelecimento de um vínculo emocional forte entre a mãe (ou cuidador) e o bebê. O contato pele a pele durante a amamentação estimula a liberação de hormônios, como a ocitocina, que promovem sentimentos de amor e conexão.
  • O ato de amamentar envolve contato físico íntimo, olho no olho e interação vocal entre a pessoa que amamenta e o bebê, ajudando a fortalecer o vínculo emocional e a construir um apego seguro.

Benefícios para a Saúde do Bebê

  • O leite materno é uma fonte completa de nutrição, fornecendo todos os nutrientes necessários para o crescimento e desenvolvimento saudável do bebê no início da vida.
  • O leite materno contém anticorpos que ajudam a proteger o bebê contra infecções, alergias e outras doenças, fortalecendo o sistema imunológico em desenvolvimento.
  • Estudos sugerem que bebês que amamentam têm menor probabilidade de desenvolver condições crônicas de saúde a longo prazo, como obesidade, diabetes tipo 2 e doenças cardíacas.

Benefícios para a Saúde da Pessoa que Amamenta

  • A amamentação estimula a liberação de hormônios, como a ocitocina, que ajudam a promover a contração do útero após o parto, auxiliando na recuperação pós-parto e na redução do risco de hemorragia.
  • Amamentar pode ajudar a reduzir o risco de certos tipos de câncer, como câncer de mama e ovário, além de diminuir a probabilidade de desenvolver osteoporose a longo prazo.
  • O ato de amamentar pode proporcionar uma sensação de realização e satisfação emocional para a pessoa que amamenta, fortalecendo sua confiança em sua capacidade de cuidar do bebê e promovendo o bem-estar emocional.

Desafios do retorno ao trabalho

Ao retornar ao trabalho após a licença-maternidade, a pessoa que amamenta pode enfrentar uma série de desafios relacionados à continuidade da amamentação:

  • Sentimentos de ansiedade e culpa por deixar o bebê para retornar ao trabalho, especialmente se a separação for prolongada.
  • Preocupações com a capacidade de manter a produção de leite enquanto cumpre as responsabilidades profissionais.
  • Estresse emocional de conciliar as demandas do trabalho com as necessidades do bebê, resultando em sentimentos de sobrecarga e exaustão.
  • Pressão social ou familiar para interromper a amamentação ao retornar ao trabalho, gerando conflitos internos e sentimentos de inadequação.
  • Necessidade de estímulo contínuo para manter a produção de leite, muitas vezes exigindo a extração de leite durante o expediente de trabalho.
  • Possibilidade de ingurgitamento das mamas devido a intervalos prolongados entre as sessões de amamentação ou extração de leite.
  • Desconforto físico causado pela falta de um ambiente adequado para amamentar ou extrair leite no local de trabalho. 
  • Risco de mastite, uma infecção mamária dolorosa, devido à obstrução dos ductos de leite e ao seu acúmulo nos seios.

Esses desafios físicos e emocionais – que as pessoas enfrentam, na maioria das vezes, de forma privada e silenciosa – podem afetar significativamente a experiência de quem amamenta ao retornar ao trabalho. É fundamental que as organizações reconheçam e apoiem essas necessidades, oferecendo políticas e práticas que facilitem a continuidade da amamentação, promovam um ambiente de trabalho inclusivo e ofereçam suporte emocional.

Legislação Brasileira e Apoio à Amamentação

No Brasil, a legislação trabalhista prevê alguns direitos para as empregadas celetistas que estão amamentando. Entre esses direitos, está a garantia de pausas para amamentação ou para a extração de leite materno durante a jornada de trabalho. As empresas são obrigadas a fornecer um local adequado para a realização dessas atividades, conhecido como sala de amamentação, que deve ser higiênica, segura e confortável. 

1. Constituição Brasileira:

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 6º, assegura o direito à saúde como um dos direitos sociais fundamentais. Além disso, o artigo 227 estabelece a proteção especial à maternidade e à infância, garantindo à gestante e à lactante condições adequadas de trabalho.

2. Consolidação das Leis do Trabalho (CLT):

A CLT estabelece diretrizes específicas para proteger os direitos das trabalhadoras gestantes e lactantes. O artigo 396 prevê dois descansos especiais de meia hora cada durante a jornada de trabalho, até que o bebê complete seis meses de idade, para amamentação ou para a extração de leite. Além disso, a CLT determina que a empresa deve disponibilizar um local adequado para a amamentação ou extração de leite.

3. Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA):

O Estatuto da Criança e do Adolescente estabelece o direito à alimentação adequada e saudável como um dos direitos fundamentais da criança. A amamentação é reconhecida como uma forma essencial de nutrição nos primeiros anos de vida, contribuindo para o desenvolvimento saudável da criança.

Apoio à Amamentação: Compromisso com a Inclusão

Organizações que não se enquadram no contexto do direito trabalhista, embora não estejam legalmente obrigadas a seguir essas regulamentações específicas, podem considerá-las como referência para a criação de políticas e práticas que apoiem a amamentação de forma adequada e inclusiva.

Ao adotar medidas similares, como a disponibilização de espaços adequados para amamentação ou extração de leite e a concessão de pausas durante a jornada de trabalho, as organizações podem demonstrar seu compromisso com a promoção da saúde e do bem-estar das mães que amamentam, independentemente de sua estrutura legal.

Essas medidas não apenas beneficiam as pessoas colaboradoras diretamente envolvidas, mas também contribuem para a criação de um ambiente de trabalho mais humano, inclusivo e respeitoso com as necessidades individuais.

Jornada Flexível

Uma das maneiras mais eficazes de apoiar a amamentação no local de trabalho é oferecer uma jornada flexível. Permitir que as lactantes ajustem seus horários de trabalho para acomodar as necessidades de amamentação do bebê pode reduzir o estresse e facilitar a continuidade da amamentação. Isso pode incluir a possibilidade de fazer pausas ou para extrair leite, bem como a opção de trabalho remoto, quando viável.

Trabalho Remoto e Intervalos Adequados

Embora o trabalho remoto possa ser uma opção conveniente para muitas mães que amamentam, é importante reconhecer que nem sempre é possível amamentar o bebê durante reuniões ou tarefas consecutivas – seja pela natureza dessas tarefas, seja pela situação de cada bebê.

Nesses casos, é essencial que os gestores entendam a importância de oferecer intervalos adequados para permitir que as lactantes cuidem de suas necessidades de amamentação. Isso pode significar agendar pausas regulares durante o dia de trabalho ou permitir que as mães interrompam suas atividades quando necessário.

Sensibilização dos Gestores

Por fim, é fundamental sensibilizar os gestores das organizações sobre as particularidades das pessoas lactantes e a importância de apoiar a amamentação no local de trabalho. Isso envolve educar os líderes sobre os benefícios da amamentação, as recomendações das autoridades de saúde e as políticas e práticas que podem ser implementadas para facilitar a amamentação no ambiente de trabalho.

Em suma, apoiar a amamentação no local de trabalho é uma questão de saúde pública e de promoção da igualdade de gênero. Ao adotar políticas e práticas inclusivas, as organizações podem não apenas promover o bem-estar das pessoas que amamentam e de seus bebês, mas também criar um ambiente de trabalho mais saudável e produtivo para todos os funcionários.

Na Mosaice, acreditamos que a amamentação no local de trabalho é um investimento estratégico que beneficia as empresas, seus funcionários e toda a sociedade. Através de nossas consultorias, auxiliamos empresas a construírem ambientes de trabalho mais plurais e inclusivos, onde as mães e pessoas que amamentam possam se sentir valorizadas e realizadas.

(Ela/Dela) Consultora e Palestrante
Mestra em Direito Penal pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ) e bacharela em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), Júlia também possui formação complementar pela Université de Lille, na França. É autora do livro UPPs: Governo Militarizado e a Ideia de Pacificação.